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Quinta-Feira, 11 de Fevereiro de 2010 | Versão Impressa
O show e o projeto poder
Rolf Kuntz*
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Partindo de Lula, esse desafio seria apenas mais uma esperteza, rasteira como tantas outras. Na boca da ministra, ganha um tom diferente: ela parece acreditar na relevância e no valor informativo desse confronto de números e de obras. Também essa crença é indicativa do padrão da Mãe do PAC.
A comparação relevante é outra, mas não é assunto para palanque nem proporciona grande novidade ao público razoavelmente informado. O crescimento econômico do período Lula simplesmente não teria ocorrido sem o governo anterior - de fato, sem os dois governos anteriores.
A economia brasileira foi reformatada entre 1994 e 2002. Nenhum avanço teria ocorrido a partir de 2003, se não se tivesse eliminado a hiperinflação e não se houvessem criado as bases para uma política monetária eficiente e para um controle maior das contas públicas.
Tudo isso é bem conhecido e realizações desse tipo não são comparáveis com números de obras e de empregos. São condições para a execução sustentável de programas de obras e de criação de empregos.
O presidente Lula sabe disso. Evita reconhecê-lo, mas poderia ter contado essa parte da história à ministra Dilma, para instruí-la um pouco mais sobre os fatos. Ela tem um diploma de economista e essa conversa poderia trazer-lhe sugestivas lembranças da vida escolar.
Foram cometidos, é claro, alguns erros graves no governo de Fernando Henrique Cardoso. A valorização cambial prolongada foi um desses equívocos. Funcionou como âncora dos preços durante algum tempo, mas acabou prejudicando o equilíbrio externo. Economistas do governo confiaram demais na poupança estrangeira como fator de crescimento e o fizeram no pior momento, num mundo cheio de turbulências.
A crise cambial de janeiro de 1999 foi o preço desse erro. Mas a recuperação foi rápida e as inovações implantadas no mesmo ano - câmbio flutuante e metas de inflação - tornaram-se elementos essenciais da política econômica, juntamente com o compromisso do superávit primário. O presidente Lula manteve esse conjunto de instrumentos. A Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada em 2000, e a disciplina imposta a Estados e municípios, quando suas dívidas foram renegociadas nos anos 90, completaram o balizamento da política econômica.
Inovações desse tipo foram imensamente mais complicadas, em termos técnicos e políticos, do que qualquer realização a partir de 2003. Além do mais, a abertura da economia brasileira, no começo dos anos 90, a privatização de atividades típicas de mercado e a modernização da política do petróleo aumentaram a eficiência e a competitividade da produção. O sucesso do governo Lula - e isso inclui a redução da pobreza - foi um desdobramento dessas mudanças.
Quando se examina a história recente a partir desse ponto de vista, fica evidente o absurdo da comparação de obras e números, embora também os avanços na redução da desigualdade e na universalização do ensino fundamental tenham começado bem antes de 2003. As séries históricas do IBGE não deixam dúvida quanto a isso.
Alguns dos petistas mais articulados, como o recém-eleito presidente do partido, José Eduardo Dutra, falam em continuidade, prometem a manutenção das bases de uma economia saudável e desafiam os tucanos a detalhar seus planos de mudança. Esse é o desafio sério, não o da comparação estapafúrdia proposta pela ministra Dilma Rousseff. Mas o presidente Lula escolheu a ministra como candidata, embora nada, em seu currículo administrativo ou político, a recomende para o cargo. Que plano de poder dá sentido a essa escolha? Eis um tema de reflexão para o eleitor preocupado com a democracia.
*Rolf Kuntz é jornalista
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